Vampiro: Santa Dômina
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Daniela Fernandes

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Mensagem por Lnrd Qui Jan 10, 2019 1:18 am

A fome devia ser enorme pra justificar aquele cachorro coberto de sarna lambendo o sangue do chão, ignorando o estrondo do tiro, os gemidos de agonia vindos do rapaz esquelético e os berros do senhor em frente ao carro com a porta da frente aberta: “... pra aprender a respeitar os outros, vagabundo!”. Uma música sobre “dinheiro” e “piranhas” escapava o veículo, trilha sonora ao vivo.

Os pneus carecas da moto mal tinham parado de girar quando os primeiros celulares apareceram no cruzamento, aparentemente mais interessados em registrar a situação do que em ligar para uma ambulância ou qualquer outra autoridade.
Por trás do capacete de tubarão, o garoto chorava e dizia coisas sem sentido, gritando pela mãe. O segundo disparo, finalmente, afugentou o cão de focinho empapado daquele mel avermelhado.

Projéteis cortavam o nevoeiro das bombas de gás quando, completado o prazo judicial para o fim da greve, a Guarda Nacional entrava em conflito com a PM na tentativa de refrear o movimento iniciado após as polêmicas declarações do governador sobre “vagabundos que só querem saber de dinheiro”. O exército também movia-se nas ruas nessas 44h de paralização, mas, sem surpresa, as prioridades eram a Ilha e a Zona Norte. Uma policial guiava um colega de farda que tinha o rosto ensanguentado e a mão em um dos olhos.

Na quadra universitária, uma briga era apartada com dificuldade. Eram 20h e alguns poucos grupos, ainda com mochilas a tiracolo, tentavam aproveitar o início da calourada. Apesar de a expectativa de público naquelas condições ser baixa, esperava-se que ao menos quem vivia nas proximidades começasse a chegar em uma, uma hora e meia. Ao menos “se” a festa continuasse: a confusão era justamente porque uma frente de estudantes gritava, com alguns documentos em mãos, que o Centro Acadêmico era um antro de drogas e exclusão. “Privilégio!?”, gritava o rapaz do abaixo-assinado, vestindo uma camisa da seleção e um boné com os dizeres “respeito” sobre a bandeira nacional.

Na TV, a âncora atualizava o status do conflito entre agentes da lei para, em seguida, entrarem imagens amadoras sobre consequências da falta de policiamento: de uma loja saqueada para uma briga num bar para um ônibus incendiado para um rapaz linchado na frente de um shopping. As matérias seguintes – a denúncia sobre o recebimento de uma bicicleta como propina que recaia em um senador de oposição e uma sequência de especialistas falando sobre as propriedades da banana – criavam uma narrativa aparentemente desconexa. “Tudo ladrão”, reclamava o vigia do museu.
- Mais alguém vem? – havia perguntado de subido à diretora do setor de documentação enquanto ela passava mais cedo, disfarçando algo no telefone.
- Não sei. – respondeu – Era pra todo mundo participar desse corujão, mas essa história de greve... .
- A população que leva a pior... – começou ele, mas a senhora apenas continuou o caminho, mais preocupada com o prazo para o envio das papeladas do que com a opinião política daquele “subalterno”.

Num cruzamento qualquer, após um assassinato qualquer, alguém tocava o rastro do ferimento, difícil distinguir se do corpo levado ou do que parecia um animal, agora esbagaçado pelo trânsito. Uma foto enviada. Passos que se distanciavam.

O vento agitava as árvores naquela noite, enquanto algumas nuvens, tapando a lua nova, jogavam um pano sobre a feiura daquela cidade.
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Mensagem por Francisco Qui Jan 10, 2019 9:45 am

Assim que percebe as portas do ônibus abrirem em sua frente, o vulto branco, aceleradamente, adentra o veículo. Já em seu interior, ela come sem muita cerimônia – porém com muita pressa – um sanduiche de alguma coisa branca. O temor de chegar atrasada para o estágio no Museu de História Africana era tanto que seu jantar já estava quase perdendo o sabor. Agora o comendo com certo esforço, ela pondera sobre as justificativas que tinha à sua disposição. Poderia dizer que a manifestação dos policiais militares havia atrapalhado a circulação da frota dos transportes públicos – o que não era uma mentira. Terminando a refeição, ela limpa as migalhas de pão da boca e da blusa branca e saca seu celular do bolso da calça.
Em um grupo de amigos/colegas de sua faculdade, em uma rede social específica, ela vê o início de um vídeo respeito da calourada que estava acontecendo naquele mesmo instante, enquanto ela estava dentro do ônibus. Mas ela não reproduz o arquivo. O ignora e arrasta o dedo para visualizar as mensagens mais recentes. É quando percebe que foi compartilhada uma foto de algum sujeito morto, deitado. Ela lê um comentário em resposta àquela imagem. Era sobre as consequências da greve policial para a população civil. Nesse momento, sentiu um calafrio. Lembrou-se de que, após o estágio, teria de voltar para casa sozinha. Seu bairro estaria mais perigoso naquela noite e esse pensamento dificilmente seria esquecido. Ela bloqueia a tela do seu celular e põe novamente no bolso, atravessa a catraca, saca um texto impresso da mochila e procura um lugar para sentar-se e estudar até que chegue a seu destino.
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Mensagem por Lnrd Qui Jan 10, 2019 3:58 pm

Distante do olhar do turismo e do interesse da classe média, o transporte público na zona sul era precário: veículos velhos, barulhentos, sujos e de suspensões ineficientes.

Estas, somadas aos buracos das vias, tornavam o ato de ler uma dificuldade.

Sem fones de ouvido, alguém escutava uma versão bastante brega de um sucesso internacional. Ao mesmo tempo, um senhor de olhar nervoso palestrava versos bíblicos a uma plateia desinteressada. “Se algum homem da casa de Israel ou algum estrangeiro que mora entre vocês comer o sangue de qualquer criatura”, falava ele numa pronúncia embolada, porém convicta e citando de memória, “eu certamente me voltarei contra aquele que comer o sangue, e o eliminarei dentre seu povo”. Um xingamento cortara o ar, mas não direcionado a ele - a motorista, talvez por mal funcionamento do sinal de parada, irritara um passageiro ao passar da descida dele.

“Pois pareceu bem ao espírito santo e a nós não impor a vocês nenhum fardo além destas coisas necessárias: que persistam em se abster de coisas sacrificadas a ídolos, de sangue, do que foi estrangulado e de imoralidade sexual”. O tom era o mesmo; o público, outro. No fluxo do ônibus, quase ninguém que pegara o discurso inicial ainda permanecia lá. De fato, pouca gente ia naquele sentido, naquela noite.

Na rua, poucas almas.

De um carro, aos gritos, alguém atirou os restos de um lanche na janela do coletivo. “Bando de pobre fodido!”, ria à distância, entrando numa rua lateral.

A ponto de embarque e desembarque não era próximo à entrada do museu, mas a senhora ao volante decidira que a área iluminada pela fachada era mais segura, deixando que saíssem alí. Ainda havia gentileza naquele mundo áspero.

O exterior da galeria era bastante discreto, algo que dividia opiniões. Na verdade a estrutura era uma antiga instalação militar, austera e bruta, adaptada para um fim considerado mais nobre.

Havia um grande estacionamento, mas àquela hora apenas uns poucos veículos eram vistos. Um dos vigilantes, um rapaz bastante novo, dormia à porta da edificação.


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Mensagem por Francisco Dom Jan 20, 2019 11:31 am

Daniela desce do ônibus tão apressada quanto subiu. De relance ela percebe o transporte se afastar aos poucos pela avenida e olha rapidamente a hora em seu celular, distraindo-se. Dois segundos de distração são suficientes.
E abruptamente ela tropeça.
Enquanto cai visualiza seu celular arrastar-se um pouco à sua frente, ainda com a tela acesa.
Ela finalmente cai! Batendo forte os cotovelos no chão. Um segundo é suficiente.
E ela levanta-se num salto, já examinando seu corpo, esperando não verificar nenhum machucado ou a presença de sangue, embora esteja sentindo algumas dores. Em seguida ela sacode a roupa e se abaixa para pegar seu celular.
“puta merda!” Ela analisa o aparelho em suas mãos então exclama!
Ela para de pé, ainda com os fones de ouvido, mas agora sem música, e repara na tela. O celular ainda exibe o horário. Ela julga que por conta de seu atraso, uma análise mais demorada terá de esperar. Sua mão põe o aparelho novamente no bolso e então ela começar a andar rápido novamente. “Só me faltava essa mesmo...”.
Ainda andando em direção ao museu ela pensa que se não houvesse chegado ninguém antes dela, ainda haveria tempo de ir ao banheiro e se lavar, analisar mais detalhadamente seu celular e seu corpo. Sem perder o ritmo do passo, desvia seu rumo primeiro e agora se direciona ao estacionamento do museu a fim de investigar se alguém que possui transporte já havia chegado antes dela.
Não gostaria de parecer incompetente e atrasada, ainda mais que como estagiária, sua permanência na instituição é mais sensível do que o de um funcionário já estabelecido. Sua preocupação maior é com a diretora, e é o carro dela que primeiro Daniela procura identificar.
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Mensagem por Lnrd Dom Jan 20, 2019 1:18 pm

Os olhos cerrados do segurança não acompanharam a vergonha de Daniela, mas nada garantia que outras coisas não mirassem a garota naquela noite.
Ido o ônibus, a vizinhança sinistramente vazia foi deixada à lâmina de um vento agourento que, levando consigo poeira e folhas, cruzou o estacionamento.
Não havia estrelas no céu.

Havia quatro carros sob a luz dos postes: um prata e levemente alongado, de design sinuoso, que todos sabiam pertencer à chefe da documentação; um quatro por quatro compacto, cuja brancura sugeria nunca ter entrado numa trilha, como o qual um estagiário sempre chegava; e dois outros, um preto e um vermelho, que dificilmente viriam à memória de quem nunca tivesse objetivamente reparado neles nalgum momento anterior.

Um apito no comunicador faz o vigia despertar e, percebendo alguém à distância, aprumar-se, tentando fingir que estava atento o tempo todo.
- Tudo ok aqui – diz ele após levar o rádio à boca, conversando com algum colega que fazia ronda noutra parte do museu.

Moço, possuía uma voz arranhada e anasalada. Na realidade, o corpo magricela e a juventude dele, mais do que qualquer fato sobre a efetiva competência do rapaz, levantavam comentários maldosos sobre a contratação dele: uns apontavam o fato dele ser primo de uma secretária; outros, contavam histórias sobre ele ser apadrinhado de algum político; havia ainda quem insinuasse que ele era amante de um dos membros do conselho da instituição, um pai de família tradicional.
Hipocrisia e corrupção eram lugar comum em Santa Dômina.

Ao lado dele, a entrada – com iluminação reduzida – lembrava a boca duma caverna.


Última edição por Lnrd em Qua Fev 06, 2019 12:58 pm, editado 1 vez(es)
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Mensagem por Francisco Qua Jan 30, 2019 8:54 pm

Após constatar a presença do carro da diretora no estacionameto, Daniela baixa a cabeça e encaminha-se rapidamente para a entrada do museu. Ela sente ventos frios arrepiarem sua pele enquanto anda.

Um pouco mais próxima da entrada do museu e mais distante do estacionamento ela ergue a cabeça: a imagem de um homem fardado a guardar a porta lhe parece mais nítida a cada passo que dá. Ela então resolve deixar sua respiração mais ofegante, na tentativa de que o vigia perceba toda a sua pressa. Não que ela encontrasse um motivo lógico para isso, a não ser o de que ela fabulava que deveria parecer competente e comprometida com seu estágio tanto o quanto ela achava que realmente era. Para tal, manter a respiração ofegante poderia, assim ela pondera, comunicar a quem a visse que ela se apressou bastante para estar ali, que se esforçou fisicamente mais do que o habitual para tentar compensar seu atraso. Tanto que mesmo já sabendo da presença da diretora,  antes mesmo de adentrar nas imediações do museu, dirige-se ao homem à sua frente com voz atropelada:
- Boa noite. A diretora já chegou? Meu ônibus atrasou bastante por conta do protesto policial!

As palavras saem de sua boca tentando acompanhar a velocidade em que seu corpo se aproxima do sujeito à sua frente. Enquanto são proferidas, Daniela esfrega os cotovelos na intenção de que o homem questione o motivo.
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Mensagem por Lnrd Qui Jan 31, 2019 12:49 am

- Tão certo – disse de forma despreocupada, talvez por ver-se diante de alguém de idade parecida com a dele. Sorria ao falar ou seria apenas para ela? – Só foda que pobre se fode. Hoje meu turno caiu na noite e só vou embora de manhã, então OK. Mas acabei de ver que os ônibus vão parar de circular. Duvido que vão pagar táxi pra quem não tem carro... .

Sabia que ela era estagiária. Não uma que vinha de carro como o rapaz esnobe que chegara mais cedo trazendo embalagens que, pelo cheiro e formato, eram pizzas. A garota era das que usavam a parada de ônibus próxima. Aquela na qual, vez por outra, algum assalto ocorria. Vigiar, afinal, era a função dele e, enquanto parte da equipe do museu provavelmente não o reconheceria na rua, ele reparava em quem, nos diversos horários, frequentavam o local.

- Ah! A diretora chegou sim – continuou, num fluxo de quem, ou por ter passado muito tempo só, ou por agir assim naturalmente, fala bastante. – Tá com todo mundo no laboratório dos computadores, ela pediu pra avisar a quem chegasse. Chegou tem um tempinho. Ela, o secretário dela, o menino do carrão com o estagiário novo, o pessoal do jurídico, a Flora e o Bernardo da biblioteca e a moça da comunicação. Acho que ninguém mais quis arriscar levar um tiro por conta de trabalho... – Não parecia reparar no mau agouro daquela opinião atirada sem ser solicitada.

A última greve, de fato, foi marcada por alguns saques, roubos de caixa pela periferia e até fuga de preso. A situação atual, logo, não era nada promissora. Quem gostaria de esbarrar com um fugitivo numa situação daquelas?

- É Daniele, né? Bateu o cotovelo no ônibus? Não sei se vai ter gelo não... esses motoristas só faltam matar a gente... – ele havia reparado nos movimentos dela e perguntou franzindo a testa, preocupado. Era um funcionário atencioso.
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Mensagem por Francisco Dom Fev 03, 2019 10:35 pm

- Oh, droga! - Dani demonstra desespero com a notícia que acabara de ouvir. De tão impactante, ela esqueceu-se de suas dores - Como assim não vai ter ônibus!? Que merda! Tu sabe a partir de que horas eles vão parar de rodar!? Nossa, eu nem sei o que fazer! Eu moro muito longe daqui e minha grana só dá para passagem de ônibus! - Nesse momento, um tom de indiganção preenche sua voz e ela continua - Pior que os caras estão corretos em veinvidicar os direitos deles, mas é que nem tu falou: só quem se fode é pobre mesmo!

Após fechar a boca, após proferir a última palavra - "pobre" - ela sente se intensificar a sensação de vulnerabilidade em que se encontra. O desespero aumenta e ela tenta pensar em suas possibilidades o mais rápido possível. Das mais absurdas como a de passar a noite dentro do museu para no dia seguinte ir para a faculdade ou a de pedir dinheiro emprestado a alguém para ir de táxi para casa! Mas será que algum motorista iria deixa-la em casa? Sendo que ela tinha a impressão de que sempre que falava em qual bairro morava as pessoas olhavam-na com receio! Nesse caso, ela teria de pedir que o taxista a levasse, não para sua casa, mas para a casa de sua amiga da faculdade, Laura, mas para isso ela teria de conversar antes com Laura? E se ela não fosse bem-vinda para passar a noite lá? Nunca precisou dormir na casa de algum amigo ou amiga antes! E se ela pedisse para o estagiário uma carona?! Mas ela achava ele esnobe. Uma pessoa como ele, em sua cabeça, nunca ajudaria alguém como ela. E se ela pedisse para dormir na casa de alguma das pessoas que o vigia falou que já haviam chegado!? Nem pensar! Ela não tinha certeza que algum deles ajudaria! E se ela pedisse para seu primo conseguir a moto de algum vizinho para ir busca-la? Mas se alguém assaltasse eles no caminho? Enquanto seus pensamentos borbulhavam em possibilidades de resolução e problemas inerentes a essas mesmas possibilidades, ela se encosta um pouco na parede. Suas pernas que começam a formigar ficam um tanto fracas (sensação que em seguida passa a circular por todo seu corpo), o suor passa a sair de sua pele e sua cabeça não cessa de girar - um vendaval confuso de absurdos.

Ela tem a impressão de ter ouvido o vigia falar algo, porém não conseguiu destinguir as palavras - se é que foram ditas ou se não foi um delírio de sua cabeça. Tudo estava embaçado e isso não era bom!

Ainda encostada, ela coloca sua mochila sobre o corpo, abre um bolso e saca um comprimido dentro de uma cartela de medicamentos que estava parcialmente vazia. Num movimento trêmulo e apressado ela destaca da cartela o comprimido e o põe na boca. Em seguida suas mãos abrem uma garrafa d'água que está no bolso lateral de sua mochila. Aquela água quente percorre sua garganta, levando o comprimido ao seu estômago e provocando tosse na jovem.
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Mensagem por Lnrd Dom Fev 03, 2019 11:59 pm

Tudo foi de tal forma confuso que mesmo o garoto, Maicon, parecia desnorteado. Demorara a perceber o mal súbito que acometia a estagiária, levado pelo próprio falatório ininterrupto. Ao reparar que algo fora do ordinário ocorria, colocara-se a tentar, sem jeito, socorrer a moça. “Senta aqui”, disse oferecendo a cadeira ainda quente na qual a pouco cochilava. “Você tá bem?”, perguntara numa retórica sem sentido diante do que era bastante óbvio àquele ponto.

Respondera – ou não? – que os ônibus já não estavam mais saindo dos terminais urbanos, limitados aos que já estavam nas ruas. Tentara – da forma certa? – usar o comunicador pra alertar o outro guarda, mas sem sucesso. Escutara-a sugerir – ou havia apenas pensado consigo? – que era melhor encontrar ajuda no escritório. Em suma, simplesmente disparou afobadamente para dentro do museu sem dar tempo de – ou sem ouvir – qualquer protesto.

O lugar era um basicamente um retângulo, com as salas de trabalho reservadas aos fundos, do lado oposto ao da entrada. No interior, de paredes grossas e algo rústicas, a imagem dele logo sumiu, ziguezagueando por entre estátuas antigas e outras obras das quais pouca gente entendia. No caminho, ainda tentou utilizar o walkie talkie, continuando a encontrar apenas estática e silêncio. Lembrou, já na metade do trajeto, que poderia ter tentado o telefone da recepção. Aquela, afinal, era a forma mais rápida de entra em contato com alguém na construção, uma vez que o pesado concreto afetava o sinal de celulares nas proximidades. Além, a conexão wi-fi não fora instalada nas galerias “pra que essa porra dessas pessoas parem de ficar tirando merda de selfie e se concentrem na porcaria das obras”, segundo palavras da chefe.

Na parte externa, latidos acompanharam o alarme de um carro que disparara à distância. Ou seria uma casa sendo arrombada?

Estranhamente, o vigia parecia demorar mais do que o necessário para voltar, deixando Daniele ao relento e sozinha.
Morcegos - provavelmente herbívoros inofensivos, o que era mais lógico - emitiam pequenos gritos noturnos para se orientarem em vôos quase cegos.

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Mensagem por Francisco Dom Fev 10, 2019 10:55 am

Cansada de esperar pelo homem que se mostrara tão atencioso - mas também tão desnorteado - para ela, Daniele decide por sair dali. Já demorara tempo demais esperando. E à medida que seu estado grogue ia se deteriorando, à medida que ia tomando consciência da situação, essa sua constatação parecia-lhe mais nítida.

Sentada e com a mochila do colo, ela abre o zíper do compartimento maior e puxa uma agenda que usa para anotar coisas importantes como roteiros para seus rituais particulares, lembretes de atividades da semana, receitas das trufas que vende nos finais de semana, leituras da faculdade, alguns desenhos... Uma coisa seguindo a outra sem muita organização. Numa das primeiras folhas ela escreve uma pequenina mensagem para o tal vigilante noturno. Nada demais. Apenas um agradecimento pela atenciosidade e uma breve justificativa pela saída dela de onde ele a deixara. Por mais que ele tenha sido inconveniente e desastrado deixando-a ali sozinha, por mais que tenha sido irresponsável e anti-profissional ele ter abandonado a entrada no museu, onde deveria estar vigiando, sobretudo numa noite tão escura e perigosa, em que a possibilidade de crimes aumentam consideravelmente devido à falta de policiamento ocasionada pela greve dos servidores públicos. Como um funcionário encarregado da segurança de uma instituição tão importante, com tesouros históricos tão preciosos, poderia fazer uma coisas dessas? Será que se fosse um museu de arte européia, a vigilância do museu seria diferente? Pensando nisso, e olhando para a cor de sua pele, ela se irrita e decide de imediato riscar o pequeno bilhete.

Ao pôr a caneta com força sobre o papel, porém, ela hesita. Pondera que pode ser proveitoso manter um certo vínculo com esse homem: ela poderia precisar dele no futuro, considerando que ambos trabalham no mesmo lugar e que poderiam se esbarrar mais vezes ali. Talvez, ela pondera, se ele tiver algum transporte, ela pode solicitar que ele a leve para casa ainda mesmo nesta noite. Ela, em seguida de sua reflexão, rasga o pedaço de papel e fecha o zíper da mochila após pôr o caderninho dentro. Levanta-se, bebe um pouco de água e deixa sua garrafa aos pés da cadeira. E o papel rasgado contendo a mensagem ela põe sobre a cadeira onde estivera. A reação do vigia ao ver aquele papel é o que a interessa. Não sobre a mensagem na frente do papel, mas sobre o verso.

A folha da agenda em que ela escrevera o bilhete é uma daquelas com espaços destinados especificamente para colocarmos dados básicos: nome, endereço, e-mail. E o pedaço que estava ali dobrado sobre a cadeira parecia - assim ela teve a intenção de fazer parecer - ter sido rasgado desintencionalmente contendo a informação de seu número de celular e - para indiciar ainda mais a suposta aleatoriedade daquele pedaço rasgado - a informação de seu tipo sanguíneo e um fragmento de seu último sobrenome. Como o vigia reagiria? Ao ler o bilhete, será que ele responderia à gentileza, já que teria acesso ao contato da garota? Será que ele avistaria a garrafa deixada ali de propósito e contactaria ela a fim de tentar devolver, caso não sentisse vontade de responder ao agradecimento de Daniele? O que importa é que ela precisava voltar pra casa de noite! Nem que tivesse de ignorar o descaso do vigia com um patrimônio cultural do museu!


Ela vira as costas para a entrada do museu e segue quase sem ver direito na escuridão do recinto. Saca uma bala sabor café e põe na boca pensando em como um copo da bebida (ao invés de uma bala com sabor da mesma) poderia ajuda-la a trabalhar naquela noite o mais agilmente possível para que ela possa ter tempo de pensar e agilizar um jeito de ir pra casa. Sim, ela deveria, ao chegar na sala de trabalho, verificar se alguém teria feito o café , já que ela, que às vezes fazia ("o que uma pessoa estagiária não tem que fazer para conseguir meio salário", ela pensa suspirando), estava chegando atrasada!

No caminho e incomodada com a pouca luz do espaço, ela puxa o celular do bolso e ativa o flash da câmera. Isso a ajuda a se guiar pelo labirinto de paredes grossas. Ela percebe alguns morcegos a percorrerem o local, voando aqui e acolá. Ela direciona o flash de luz pro alto e tenta enxerga-los durante o caminho. Tanto olhando para o teto quanto olhando pela tela do celular em si, que não consegue captar bem os movimentos do mamífero, reduzindo-o a vultos desfigurados. Lembra-se imediatamente dos ratos que dividem o espaço da faculdade com os estudantes graças aos ratos incompetentes da gestão acadêmica que vez ou outra desviavam verbas da higienização. Durante o trajeto, ela busca explorar o local, as obras ali expostas somente para ela. Claro que ela as encontrava todos os dias. Mas de noite a má iluminação do museu lhes conferia, assim como Daniele sente, um ar distinto, tão distinto que para a moça parece mais interessante vê-las de noite que de dia. Ela reduz o ritmo dos passos cada vez que passa diante de alguma escultura - estas são as obras que chamam sua atenção naquele momento pelo modo como o volume delas formam sombras esticadas e fortes por conta da força luminosa do flash. Ela dá uma risada de canto de boca e pensa consigo mesmo como o público reagiria ao ver aquelas esculturas de noite. Pois se o público leigo, até mesmo alguns colegas de sua faculdade, associam artefatos africanos com magia maligna ou carência de racionalidade e civilidade, imagina se observassem essas esculturas africanas de noite, onde, pelo flash, as sombras conferem ao espaço um ar que ela julga ser soturno. Ela pensa rapidamente que uma visita guiada ao museu durante o período noturno poderia ser ou interessante ou absurdo demais. Uma coisa que ela deve anotar na agenda ao chegar na sala de trabalho.
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Mensagem por Lnrd Seg Fev 11, 2019 11:29 am

A noite possuía má fama, mesmo não mais mortífera que o dia.
Sob o Sol, independente do enorme peso da vigia, decisões erradas, o inesperado emergente e humores viciosos conduziam constantemente à ruína.
No reverso da manhã, o anonimato e o desconhecido reinavam. Um, era passe livre à natureza terrível da humanidade, mais assustadora que os produtos de sonhos acordados ou adormecidos. Outro, lugar da mordida de veneno, da caçada silenciosa, do obstáculo-que-não-se-vê.
O berço da escuridão, contraditoriamente, era um convite à leveza do sono, mas também à aceitação dum porvir no qual a imaginação sentava-se num trono de estrelas: a hora da Lua só era mais terrível pelo medo em si. Superstição. O fato é que aquelas imagens ofereciam pouca ameaça para além do temor irracional...
O mesmo se passava com morcegos, sendo raras espécies “chupa-sangue”, presente ali provavelmente por portas esquecidas abertas. Ou seria um problema estrutural, de descaso? Ou outra coisa?

Dentro do Museu, uma luz transbordava num corredor distante, farol rasgando a tempestade. Entretanto, oculto na penumbra, um perigo mais iminente ameaçava passar desapercebido... .
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Mensagem por Francisco Sáb Mar 02, 2019 9:52 pm

Os sons que Daniela ouve se misturam e ecoam de maneira inidentificável. Eles, da forma como ela percebe, parecem avançar por entre as obras históricas de Arte dispostas na penumbra do recinto. Há híbrido de: um gemido alto; o barulho seco do celular sendo espatifado num piso áspero; o ruído do tecido da mochila tocando o chão, pressionando, em consequência, os objetos que se encontram dentro dela.

Antes, ela estava tão concentrada observando os mamíferos alados com o auxílio do seu celular, que não atentara para onde estava a pisar.

É em decorrência disto que seus tênis escorregam em alguma coisa. Por uns instantes ela se desequilibra até finalmente seu corpo seguir de encontro ao chão.

Os segundos que separam do piso do museu do corpo em queda são mais que suficientes para que os dedos de Daniela deixem fugir o aparelho celular – o flash ainda ligado em queda ilumina aleatoriamente o espaço do museu, enquanto câmera ainda ligada grava de maneira embaçada tudo o que estava sendo iluminado pelo flash. Sua mochila desgruda do seu corpo e segue seu próprio percurso solitário em direção ao chão. Este intervalo de tempo é também suficiente para que Dani consiga soltar um barulho incompreensível, como um animal assustado, e perceber (ou ter a impressão de) que outras figuras disformes de animais estão voando com mais velocidade, como se estivessem igualmente apavorados pelos ruídos sonoros que laceram ferozmente a calmaria.
Quando finalmente pondera que talvez ela seja o motivo daquela agitação toda de vultos sobre sua cabeça, seu corpo encontra violentamente o chão, caindo lateralmente – quem sofre o impacto é o lado esquerdo do corpo – de uma forma nada silenciosa. Após o primeiro impacto, seu corpo é virado.

Suas costas se contorcem com a baixa temperatura do piso que atravessa sua blusa e sua pele, encontrando sua carne pulsante. Na queda, sua cabeça bate no chão, se ergue alguns poucos centímetros e bate novamente, mas com menos força.
Ela não consegue distinguir o barulho de sua queda ao barulho das coisas que se quebraram. Tudo parecia ter sido quebrado, afinal.
Ela permanece deitada antes de tentar tatear o chão, procurando levantar-se, mas com muita dificuldade e desorientação espacial.
Quando finalmente consegue levantar um pouco seu tronco, ela se esforça para sentar de pernas estiradas, ainda sentindo pontadas fortes na cabeça e no lado esquerdo do seu quadril, o mesmo lado com o qual ela realiza coisas importantes e o mesmo lado que abriga o braço onde fez sua última doação de sangue.
Dói bastante. Ela volta a gemer um pouco mais baixo. E tenta inutilmente olhar ao seu redor. Se houvesse alguém ali, não estava sendo possível para os seus olhos verificar a presença. No escuro, tudo o que encontra são criaturas mal iluminadas, contornos sombrios e imóveis dispostos no salão, esculturas indiferentes para a sua carne que lateja e seu corpo que treme.
Sentada ainda e com muita dor, ela vira o eixo do seu corpo para os lados e usa suas mãos para tatear o chão enquanto gira. É quando sente a textura de um tecido familiar na ponta de seus dedos e percebe que sua mochila se afastara pouco do seu corpo durante o impacto. Tateando um pouco mais a diante, ela fere a palma da mão direita com pequeninas peças pontiagudas. Ela toca a palma ferida com a outra mão e não consegue distinguir que seria aquele material. Então decide tatear o local novamente. Puta merda! Seu celular encontrava-se em pedaços. O esqueleto do aparelho encontrava-se separado de sua fonte de energia necessária ao seu bom funcionamento. Ela encontra mais pedacinhos menores de um material que ela supunha ter sido a tela do celular, a julgar que a carcaça dele estava com outros fragmentos ainda presos nela.

Porra, meu! Não dava mesmo para acreditar. Ainda mais que era a segunda queda numa mesma noite, e logo após uma crise de ansiedade!

Tudo lhe parecia estar quebrado demais para ser verdade.
Tudo lhe parecia sincrônico demais para ser verdade.

Ela havia pagado há pouco tempo a última prestação daquilo que há instantes atrás havia sido seu tão útil e barato aparelho celular. E justamente com o dinheiro da bolsa que recebera no mês passado. E especificamente ali mesmo, dentro do museu onde ela consegue dinheiro para sobreviver, acontece uma coisa dessas! Nenhum visitante distraído com selfies, ao que ela lembra, havia tido o celular espatifado. Mas ela sim.

Quanto mais pensa, mais Daniela fica trêmula!

Até que diante da transparência invisível dos fragmentos de vidro de uma tela estilhaçada no chão, fragmentos de líquidos também transparentes descem sinuosos sobre suas bochechas, indo de encontro a seus lábios, molhando-os...
Seu choro é a trilha sonora que devidamente embala o levantar lentamente e doloroso da jovem estagiária. Chorando ela rasteja um pouco e se aproxima de sua mochila e dos restos do celular - não era só ele que se encontrava em pedaços.
Diante do que restou, ela abre sua mochila com ar penoso e tira dali uma pequena marmita que, mais cedo, tinha abrigado o almoço que a menina levou para a faculdade. Ela abre o depósito já vazio e deposita-o no chão. Pedaço por pedaço, vai pondo o que foi seu celular. Primeiro, o esqueleto, depois a fonte de energia. Logo em seguida ela põe os fragmentos de vidro que são possíveis de se pegar com a ajuda das unhas.
A cada fragmento posto, ela amaldiçoa aquela realidade, ela chora de raiva mais intensamente.
Tudo que havia feito até então para ficar calma naquela noite parecia-lhe não surtir efeito. Nem as drogas farmacêuticas. Não diante disto!
Ela amaldiçoa em silêncio aquela desventura, sua má sorte. Se existisse um deus de sua realidade, se existisse um maquinista que fizesse a roda da realidade girar, ele tinha de ser um cretino desgraçado para ter espatifado seu celular – que fora obtido com tanto esforço – tão sincrônica e perfeitamente, justamente ali no lugar onde ela conseguiu recursos para poder paga-lo. Era como se zombasse dela. Como se dissesse à jovem que não importa o que fizesse, ela era apenas uma rata girando na roda no ritmo que ele controla e sempre haveria de controlar. (Como podia sua mãe ficar feliz tendo a consciência de estar sendo vigiada a todo tempo por alguém com tanto poder sobre a realidade? Ela lembra e se aborrece ainda mais). Justo ali onde ela engole sapos e palavras que lhe soam verdadeiros desaforos todos os dias por acreditar do poder de descolonização daquele museu e porque precisa da merda do dinheiro do estágio remunerado nesse mundo selvagem de pessoas que devoram umas as outras, empurrando gente como ela aos subúrbios para morrer desassistida no cotidiano. Ratos envenenados pelo maquinista. Pois é ele mesmo quem permite e observa imóvel o envenenamento contínuo de pessoas pobres.

Essa porra de mundo é uma merda mesmo!

Quando põe o último pedaço que podia ser pego de vidro molhado por suas lágrimas na marmita, ela vai dando-se conta do estado deplorável em que se encontra. Ainda chorando, ela mentaliza todo seu ódio indo direto pra marmita, como sendo uma mancha de cores roxa, cinza e branca, orgânica e desuniforme sendo empurrada pela respiração ofegante. O ódio segue saindo pelas narinas no ritmo esquizofrênico e barulhento de sua respiração e o tempo não cessa de seguir em diante. A cada passo que ele, o tempo, dá sobre os grãos de areia deserto da existência e dos mundos, ela sente sua mente se esvaziando aos poucos. Na impossibilidade de visualizar alguma coisa no recinto, ela busca visualizar seu cérebro sendo entintado de vermelho novamente enquanto sua respiração vai se regularizando. Os últimos fragmentos de seu ódio vão sendo transportados.
Nesse processo, ela não percebe em que momento as lágrimas param de ser produzidas pelos seus olhos. Mas quando fica mais calma - ainda séria, mas calma - ela tampa e marmita preenchida de restos e de ódio e põe na mochila novamente. Com a bolsa ainda aberta, ela retira de dentro o seu diário e engatinha ao lugar aonde caiu há minutos atrás. O caderno em sua mão direita.
Silenciosa ela tenta sondar pelo tato o material líquido que causou sua queda. Ela esfrega ele entre os dedos e, curiosa, aproxima seus dedos melados diante do seu nariz, para tentar achar algum odor. Em seguida, abre o diário e pressiona a página aberta sobre o lugar onde ela conseguiu achar o líquido. Aquela noite não podia ser esquecida jamais. E aquela impressão líquida no seu diário seria o vestígio necessário para tal. Ela se levanta dali com certa dificuldade e sentindo pontadas no corpo, volta-se de novo para sua mochila e põe dentro dela seu caderninho. O zíper é fechado antes de ela seguir andando em frente.
Ela anda com cuidado no local, tateando para não danificar nem esbarrar em alguma obra tri e bidimensionais escondidas no escuro. Ao longe ela finalmente visualiza uma área iluminada. É possível que ali esteja a porta que ela tem de atravessar para realizar os trabalhos daquela noite que havia começado de forma tão desastrosa. Ela segue na direção da luz e desviando das esculturas que encontra com a ajuda de suas mãos. Em sua mochila descansam uma marmita contendo os fragmentos tecnológicos de um aparelho celular e fragmentos mentalizados de ódio e, ao lado do depósito, um diário de desenhos, escritos e flores secas, no qual a última coisa que havia sido gravada, ainda nesta noite, tinha sido uma macha de forma aleatória, mas de intensão latente na memória. Para Dani, aquele era o vestígio da noite em que deus desejou quebrar seus ossos e seu espírito.
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Daniela Fernandes Empty Re: Daniela Fernandes

Mensagem por Lnrd Ter Mar 05, 2019 12:43 am

A travessia de Daniela, entrando na área de penumbra e seguindo em direção ao corredor iluminado, tirando-a da baixa-visão e jorrando corres sobre a garota, pouco a pouco deixava antever evidentes marcas sujas e molhadas da queda.
Na pele e nas roupas, as manchas inicialmente escuras iam perdendo em preto e ganhando em um estranho avermelhado viscoso – cores de alerta, vinho sanguíneo da dor.
As pegadas dela rumo à porta do escritório eram como pequenas chagas abertas.
O “memento” no caderno transformara a folha branca numa pétala de rosa.

Algo de ruim – ou de pior – a havia alcançado naquela hora turbulenta, certamente ficando gravado na mente da garota pelo resto da vida – longa ou curta.

“Deus” não estava para brincadeiras.
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Daniela Fernandes Empty Re: Daniela Fernandes

Mensagem por Francisco Dom Mar 17, 2019 7:45 pm

Quando vê o sangue impregnado em sua roupa, Dani, sem entender nada, sente um calafrio profundo e uma curta paralisia a percorrer seu corpo quando percebe que aquele sangue não vinha de seu corpo - ela não sabia se isso era bom ou ruim. Só que estava com muito medo!

Ela torce e vira seu corpo, puxa e estica sua roupa para ver o quão está melada... Incrédula ela vira-se de costas. Investiga rápida e inutilmente o escuro. E então corre em direção do escritório. Se seu corpo estava doendo, ela não estava conseguindo sentir. E seus pensamentos se dividiam entre tentar supor a origem daquele sangue e o medo de descobrir. Sua ideia agora era sair dali o mais rápido possível!

A ansiedade e o receio de não conseguir cresce proporcionalmente à medida que se aproxima da luz sobre a porta do escritório.

Até que, ofegante, ela empurra a porta com muito barulho! Com lágrimas nos olhos, ela anuncia nervosa:
- Socorro!!!!! Preciso de ajuda!!!!!!!!!
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